Ciganos são primitivos ou
apenas pobres?
Por DAN BILEFSKY
PARIS - O grupo de ciganos escutava os promotores que os
acusavam de ter vendido meninas como noivas por cerca de US$ 270 mil, avaliando
seu preço com base na sua habilidade para furtos. Três clãs familiares da
Croácia eram acusados de criar meninas e meninos, alguns com apenas 11 anos,
para cometer cem roubos em 2011 na França, na Bélgica e na Alemanha.
Uma testemunha de 20 anos disse ao tribunal que havia furtado
cerca de US$ 600 mil em dinheiro e joias, ou mais de US$ 7.000 por mês, desde
os 13 anos de idade. Ladrões menos habilidosos podem ser punidos, inclusive
sendo surrados por anciões roma (plural de "rom", forma pela qual
muitos ciganos identificam seu próprio grupo étnico).
Dos 27 acusados, 26 foram condenados por forçar crianças a
furtar, tendo recebido penas de dois a oito anos de prisão. No topo da rede
estava uma avó de 66 anos.
Esse caso em Nancy ilustra um debate cada vez mais ruidoso na
Europa acerca do que alguns chamam de "a questão rom", referência ao
povo nômade que veio da Índia para a Europa séculos atrás. Estima-se que 11
milhões deles estejam espalhados pela Europa.
A descoberta de uma criança loura durante uma batida policial em
um acampamento rom na Grécia, em 21 de outubro, e a prisão do casal com o qual
a menina vivia alimentaram especulações de que alguns roma estariam envolvidos
com tráfico de pessoas.
Na França e em outros lugares da Europa, a questão rom está
vinculada a perguntas complicadas a respeito de etnia, raça, exclusão social e
interesses políticos.
No julgamento de Nancy, a defesa apresentou um argumento
incomum: que os roma que foram para o crime estariam simplesmente agindo
conforme "o estilo da Idade Média".
Em setembro, o ministro francês do Interior, Manuel Valls,
socialista, causou furor ao dizer que apenas uma minoria dos roma conseguiria
se adequar à sociedade francesa. Muitos dos cerca de 20 mil roma da Romênia e
da Bulgária que estão na França sem terem cidadania vivem em acampamentos
esquálidos na periferia das cidades francesas.
No bairro parisiense do Marais, onde bandos de jovens roma
ousadamente roubam turistas e locais nos metrôs e nos caixas eletrônicos, uma
menina grávida dizia que esmolar era sua única forma de subsistência. "Não
temos documentos, não temos trabalho, o que mais podemos fazer?"
Acrescentou: "Também somos europeus".
Diante desse cenário volátil, a defesa apresentada no processo
de Nancy foi particularmente chamativa. "É muito difícil interpretar o
comportamento deles com base nos nossos próprios padrões do século 20", disse
Alain Behr, advogado da defesa. "Essa comunidade atravessa o tempo e o
espaço com suas tradições, e nós, na Europa, temos dificuldades em integrá-los.
No entanto, eles preservaram sua tradição, que é de sobrevivência." Behr
disse que a chamada venda de crianças noivas é parte da tradição multissecular
do dote cigano.
Mas o promotor Gregory Weill rejeitou as explicações culturais.
Ele disse que, ao chegar à cidade natal dos líderes da quadrilha, na Croácia,
os investigadores descobriram as imponentes casas de mármore da família. Nas
caravanas do clã no norte da França, afirmou ele, policiais acharam veículos
Mercedes, óculos de sol Dolce & Gabbana e bolsas Louis Vuitton.
Com grampos telefônicos, as autoridades descobriram uma operação
altamente organizada, usando crianças como ladras para evitar processos
judiciais aplicáveis a adultos. Celulares foram descartados para acobertar suas
pegadas, e receptadores se encarregavam de transformar joias roubadas em
dinheiro vivo.
"Alguém na Idade Média não seria capaz de lavar dinheiro
reunido por crianças", disse ele.
A antropóloga húngara Livia Jaroka, única representante rom no
Parlamento Europeu, sustenta que décadas de discriminação resultaram em
desemprego endêmico, pobreza extrema, baixos níveis educacionais, segregação
habitacional, tráfico humano, abuso de substâncias e altos índices de
mortalidade. "A explicação cultural para a criminalidade rom é
absurda", disse ela. "Tem a ver com a economia."
Um facho de esperança está na Espanha, onde há cerca de 750 mil
roma, quase metade deles com menos de 25 anos. Quase todas as crianças roma
concluem a escola primária. Em 1978, três quartos dos roma da Espanha viviam em
moradias inadequadas; hoje, apenas 12% estão nessa situação. Isidro Rodríguez,
diretor da Fundação Secretariado Cigano, citou o acesso à educação gratuita, ao
atendimento médico e a moradias sociais depois da repressão contra os roma
durante a ditadura franquista.
Jaroka, que cresceu em uma comunidade pobre de músicos roma em
Tata, na Hungria, disse que deve seu sucesso a seus pais, que insistiram para
que ela e seus irmãos frequentassem a escola. "Nós, os roma, também
precisamos aprender a nos emancipar".
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/newyorktimes/136204-ciganos-sao-primitivos-ou-apenas-pobres.shtml
ver também: http://alimenteocerebro.com/uma-droga-social-chamada-preconceito/
ver também: http://alimenteocerebro.com/uma-droga-social-chamada-preconceito/
PS:
O povo cigano é um dos povos mais antigos da Europa. Fugindo da Índia há milhares de anos atrás, povoaram todo o território europeu. Dizem que sua origem é egipcia, e que foram para a Índia, sendo expulsos de lá para a Europa.
Povo apegado às tradições, seus costumes são transmitidos oralmente, de geração em geração. Não valorizam a educação formal, casam-se cedo, e valorizam famílias grandes.
Por possuírem costumes inadequados ao século XX, para a Europa civilizada e moderna, são excluídos dos direitos civis, de cidadania, educação e saúde. Mesmo nascidos em território europeu, são considerados imigrantes, ilegais, e expulsos se localizados. Por isso, fogem.
Se essa segregação tão "civilizada" é causadora da criminalidade, não sei. Esmolar, ler mãos, e morar em tendas são apenas os costumes visíveis aos que não pertencem ao Povo Rom. E os demais costumes? Por que respeitamos determinados povos em seus costumes, e a outros povos não???
Não estranhamos os costumes islâmicos? E mesmo assim, respeitamos o direitos que todos têm à sua religiosidade, mesmo quando ela significa analfabetismo para as mulheres, violência, estupros, comercialização (dotes/noivado/casamentos ainda na infância). E o que dizer dos costumes do Povo Judeu? Não causam tanto estranhamento quanto os costumes do Povo Islâmico?
Mas, e se eu analisasse os costumes do meu povo, o povo brasileiro? Acaso não são diferentes dos costumes do povo europeu? E se eu falasse da minha religiosidade? Umbanda? Nossos costumes, ritos, mitos, cosmogonia, ethos, não diferem dos ritos, mitos, cosmogonia e ethos cristãos, que tangem a tradição europeia???
O que faz o povo europeu melhor que os demais povos da terra, a ponto de expulsar, segregar, e destinar todo um povo à miséria, ignorância e violência? A Espanha tem um bom exemplo de como lidar com o diferente, como ajudar na melhoria das condições de vida, mesmo que as tradições os tornem resistentes às mudanças. E os resultados confirmam que vale a pena o exercício da tolerância e do respeito ao outro.
Os últimos acontecimentos na França trazem à tona indícios de que o povo europeu ainda não superou o facismo e o nazismo. Que estes fantasmas ainda pairam no ar civilizado da Europa. Os horrores perpetrados pela colonização do Oriente, da África e das Américas não ensinaram nada?
Mais uma vez confirmo que modernidade, cultura escrita, e estética não são sinônimos de ética, e muito menos de moralidade. As leis arduamente defendidas não garantem justiça social, respeito com as diferenças e auteridade.
Obaositala
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