domingo, 29 de março de 2009

Intolerância Religiosa


Como estudante de teologia umbandista, diariamente assisto à violação do direito de culto dos umbandistas. Casas/Templos/Terreiros são invadidos, destruídos, seus donos ameaçados ou até mesmo agredidos fisicamente. De norte a sul neste país, nossos templos são violados, nossos ritos interrompidos, nossos irmãos desrespeitados.

Os agressores, declarando-se enviados de Deus, no maior exemplo de messianismo atual e de delírio religioso, acham-se no direito de atacar, agredir e destruir tudo aquilo que não condiz com sua fé. Extremistas e egocêntricos, expressam sua fé com violência e arrogância.

Esse é o maior problema atualmente. E no meu ponto de vista, esse problema não é mediável, porque expõe a vida de pessoas a risco, agride física e moralmente àqueles que querem apenas exercer a sua fé em paz.

A melhor maneira de começar a pensar no problema é promover um diálogo intereligioso. Reunir as lideranças religiosas do país, promovendo uma discussão saudável.

A FTU (Faculdade de Teologia Umbandista) tem promovido Fóruns, Encontros e Seminários acerca do assunto. Já tivemos encontros com Sufis, Monges Budistas, Espíritas e outros religiosos. Particularmente o encontro com um Sheik sufi foi o mais gratificante. Para minha surpresa, meses depois vi o sheik falando no Congresso Nacional a respeito da violência que ocorre contra nossos templos. Jamais poderia imaginar um sacerdote muçulmano defendendo a Umbanda! Esse é o maior exemplo que o diálogo pode mediar conflitos.

É necessário que as lideranças religiosas se abram a esses encontros, promovam a paz entre as religiões, desestimulando atitudes extremistas de seus fiéis, e principalmente, formando seus líderes, pastores, padres, monges com uma educação ecumênica.
Acredito também que a educação religiosa nas escolas, promovendo uma visão ecumênica, laica, permitirá às nossas crianças crescerem sem os vícios e preconceitos.

Toda essa mudança é estrutural na sociedade. Romper a barreira do preconceito religioso é fundamental para a garantia da manutenção dos direitos civis.

Somente com o diálogo franco entre todos os segmentos religiosos do país haverá a garantia de liberdade de culto.

sábado, 21 de março de 2009

Incoerência Católica

Publico este artigo magnífico, em solidariedade a meus colegas, que foram vítimas da intolerância, e da arrogância católica...


"Os males que a igreja causa em nome de Deus vão muito além da excomunhão de médicos.

AOS COLEGAS de Pernambuco responsáveis pelo abortamento na menina de nove anos, quero dar os parabéns. Nossa profissão foi criada para aliviar o sofrimento humano; exatamente o que vocês fizeram dentro da lei ao interromper a prenhez gemelar numa criança franzina.Apesar da ausência de qualquer gesto de solidariedade por parte de nossas associações, conselhos regionais ou federais, estou certo de que lhes presto esta homenagem em nome de milhares de colegas nossos.Não se deixem abater, é preciso entender as normas da Igreja Católica. Seu compromisso é com a vida depois da morte. Para ela, o sofrimento é purificador: "Chorai e gemei neste vale de lágrimas, porque vosso será o reino dos céus", não é o que pregam?É uma cosmovisão antagônica à da medicina. Nenhum de nós daria tal conselho em lugar de analgésicos para alguém com cólica renal. Nosso compromisso profissional é com a vida terrena, o deles, com a eterna. Enquanto nossos pacientes cobram resultados concretos, os fiéis que os seguem precisam antes morrer para ter o direito de fazê-lo.

Podemos acusar a Igreja Católica de inúmeros equívocos e de crimes contra a humanidade, jamais de incoerência. Incoerentes são os católicos que esperam dela atitudes incompatíveis com os princípios que a regem desde os tempos da Inquisição.
Se os católicos consideram o embrião sagrado, já que a alma se instalaria no instante em que o espermatozoide se esgueira entre os poros da membrana que reveste o óvulo, como podem estranhar que um prelado reaja com agressividade contra a interrupção de uma gravidez, ainda que a vida da mãe estuprada corra perigo extremo?
O arcebispo de Olinda e Recife não cometeu nenhum disparate, agiu em obediência estrita ao Código Penal do Direito Canônico: o cânon 1398 prescreve a excomunhão automática em caso de abortamento.Por que cobrar a excomunhão do padrasto estuprador, quando os católicos sempre silenciaram diante dos abusos sexuais contra meninos, perpetrados nos cantos das sacristias e dos colégios religiosos? Além da transferência para outras paróquias, qual a sanção aplicada contra os atos criminosos desses padres que nós, ex-alunos de colégios católicos, testemunhamos?
Não há o que reclamar. A política do Vaticano é claríssima: não excomunga estupradores.Em nota à imprensa a respeito do episódio, afirmou Gianfranco Grieco, chefe do Conselho do Vaticano para a Família: "A igreja não pode nunca trair sua posição, que é a de defender a vida, da concepção até seu término natural, mesmo diante de um drama humano tão forte, como o da violência contra uma menina".
Por que não dizer a esse senhor que tal justificativa ofende a inteligência humana: defender a vida da concepção até a morte? Não seja descarado, senhor Grieco, as cadeias estão lotadas de bandidos cruéis e de assassinos da pior espécie que contam com a complacência piedosa da instituição à qual o senhor pertence.
Os católicos precisam ver a igreja como ela é, aferrada a sua lógica interna, seus princípios medievais, dogmas e cânones. Embora existam sacerdotes dignos de respeito e admiração, defensores dos anseios das pessoas humildes com as quais convivem, a burocracia hierárquica jamais lhes concederá voz ativa.A esperança de que a instituição um dia adote posturas condizentes com os apelos sociais é vã; a modernização não virá. É ingenuidade esperar por ela.
Os males que a igreja causa à sociedade em nome de Deus vão muito além da excomunhão de médicos, medida arbitrária de impacto desprezível.
O verdadeiro perigo está em sua vocação secular para apoderar-se da maquinária do Estado, por meio do poder intimidatório exercido sobre nossos dirigentes.Não por acaso, no presente episódio manifestaram suas opiniões cautelosas apenas o presidente da República e o ministro da Saúde.Os políticos não ousam afrontar a igreja.
O poder dos religiosos não é consequência do conforto espiritual oferecido a seus rebanhos nem de filosofias transcendentais sobre os desígnios do céu e da terra, ele deriva da coação exercida sobre os políticos.
Quando a igreja condena a camisinha, o aborto, a pílula, as pesquisas com células-tronco ou o divórcio, não se limita a aconselhar os católicos a segui-la, instituição autoritária que é, mobiliza sua força política desproporcional para impor proibições a todos nós."

Drauzio Varella
14/03/09 Folha de São Paulo

domingo, 15 de março de 2009

Paradoxos da Vida Urbana


A análise atual da estrutura da sociedade, que embasada nas grandes cidades
distancia as pessoas do natural, poderia parecer bucólico, enfadonho. Mas ouso discordar.
Nasci em um sitio localizado em um pequena cidade em Minas Gerais. Em uma família rigidamente estruturada no catolicismo, nos laços consangüíneos, e na agricultura, onde todos viviam em sua pseudo-tranqüilidade.
Gerações se sucederam, até que o progresso alcançou também aqueles prados distantes. A então conhecida organização social começou a mudar. Valores defendidos por séculos foram sendo substituídos paulatinamente por bens de consumo. A tranqüilidade do campo foi substituída pela agitação das cidades. O tempo que corria manso como um rio, no respeito ao Sol e à Lua, passou a correr por entre os dedos e localizado no relógio escravizante. Mudaram-se hábitos alimentares, roupas, costumes, linguagem.
Melhoramos ou pioramos?
As mudanças chegaram sem pedir licença. Não consultaram ninguém, foram se hospedando, e pressionando para tornarem-se permanentes, até que conseguiram. Não houve opção. Poderíamos dizer que eram inevitáveis? Se quiséssemos, resistiríamos a elas?
O certo é que o Ser Humano mudou.
Certamente haverá aqueles que, saudosos dirão que degeneramos. Será mesmo? Como estava embasada aquela sociedade rural? Famílias, agricultura e Igreja. Família patriarcal, a mulher calada criava seus filhos, filhos calados obedeciam a seus pais, e mantinham a honra da família, às vezes com seu próprio sangue, em lutas por vezes seculares entre clãs. Agricultura colonial, ou de subsistência. Ou se nascia rico, filho da Aristocracia local, ou pequeno agricultor, sujeito à obediência ao senhor local, que detinha o poder. Fome, ignorância, e falta de dignidade eram os pagamentos recebidos após uma vida inteira de trabalho. E a Igreja, mãe de todos, detinha o papel de apascentar aqueles que poderiam se rebelar contra isso tudo.
Por algum motivo, esta ordem social tinha seus dias contados. Talvez, por Ordem Superior, esta ordem social deveria mudar. Direitos, deveres, liberdade (religiosa, política...), educação, saúde. Tudo deveria mudar. E para mudar, primeiro piora-se. Não é verdade que, quando queremos limpar a casa, primeiro devemos colocar tudo para cima, limpar, e depois arrumar?
Acredito que ocorre o mesmo agora com a organização social. Foi necessário desfazer-se de todos os valores arraigados, negá-los, repudiá-los, rejeitá-los. Buscar outras formas de viver. Vivê-las. E agora, anos após todas as mudanças (limpeza), recolocar no local aquelas coisas que valiam a pena. E para isso, há um balanço inevitável. Daquilo que negamos, o que realmente perdemos de verdade? O que realmente era bom? O que devemos resgatar?
E será que tudo que renovamos foi bom? O que ainda merece ser mantido?

sábado, 14 de março de 2009

A Ciência e o TAO



Tao 道 - Caminho da espontaneidade
Na sociedade ocidental, onde tudo é meticulosamente planejado e articulado, onde ficou nossa espontaneidade? Afinal, o que deseja nos dizer essa escola milenar de pensamento, que tanto iluminou o Oriente, e que aos poucos vem angariando adeptos fervorosos no Ocidente, inspirando filósofos e teólogos?
O Tao é identificado como o Absoluto, que por divisão, gerou o Yin e o Yang, os opostos, e ao mesmo tempo complementares, que formam todas as coisas que existem no Universo.
À semelhança do Hinduísmo, e do Budismo, o Taoísmo se interessa pela sabedoria intuitiva, e não pelo conhecimento racional. É um caminho de libertação do mundo, compreendendo e respeitando a profunda sabedoria que guiou a espécie até aqui.
Então, como foi que chegamos a tão intenso desequilibrio com o Tao? Onde foi que o Ocidente se perdeu? Haverá meio de retornar a esse equilibrio?
Somente a união entre Religião, Arte, Filosofia e Ciência num mesmo ideal garantirá o equilibrio cósmico. Portanto, os quatro pilares do conhecimento humano, que separados geraram desarmonia, juntos mostrarão o caminho da harmonia. Esse é o Caminho da Síntese. Comecemos por analisar a Ciência.
Na Medicina tradicional Chinesa, toda doença é sinal de desequilibrio entre o Yin e o Yang. O equilíbrio do corpo é mantido através do fluxo equilibrado do Qi (ch´i) dentro dos meridianos. E os pontos de Acupuntura servem para tratar estes desequilíbrios. Também são utilizadas técnicas de meditação (Tai Chi Chuan, Liang Gong, Chi Kun), e massagem (Tui Na, Do in) como fonte de terapia, e a fitoterapia ainda é o principal recurso de tratamento das doenças mais comuns na China. A Medicina curativa na China é considerada a falência da Medicina Preventiva, uma derrota do médico.
Enfim, Fitoterapia, dietoterapia, meditação e Acupuntura são os principais recursos utilizados pela sociedade chinesa há milhares de anos, e ao contrário do que poderíamos esperar, ela está cada dia mais numerosa e influente.
Então, se tal conhecimento permitiu a sobrevivência e a manutenção desta sociedade, onde o conhecimento Ocidental chegou a bem menos que 70 anos, o que nos pode ensinar esta cultura fabulosa? Por que nos desenvolvemos em pólo tão oposto? Estaríamos aí também confirmando a teoria do Yin e Yang?
Vejamos o que ocorreu conosco...
Até pouco tempo atrás, o conhecimento humano era unificado e integrado à vida prática. Arte, ciência, filosofia e religião eram os pilares de um conhecimento único, confundindo-se, misturando-se, sem cisões, ou limites rígidos e bem definidos. Basta estudarmos algumas culturas antigas, para descobrirmos que índios, hindus e até mesmo os orientais tinham uma visão mais ampla da vida... para eles tudo era interdependente, como uma rede de relações. Até aí, tudo igual.
E então, a partir do Iluminismo, a ciência deixou gradativamente de ser arte, e tb filosofia, e principalmente, religião. O conhecimento tornou-se fragmentado (Descartes).
A Medicina, considerada a Arte de curar, Sacerdócio de Abnegação e Caridade, rompeu bruscamente com a Sabedoria Antiga, dando início a uma era de experimentação científica e tecnológica, relegando ao descaso tudo que já se havia falado e praticado. Olha-se agora para um corpo doente, buscando culpados e soluções rápidas e fáceis para eles. Primeiro, os Miasmas, depois as bactérias, fungos, vírus, agentes externos. Agora, a genética determinista e irremediável... Interação de Genética, Meio e Sistema imunológico formam a teoria de adoecimento mais aceita atualmente. Surge então, a Indústria Farmacêutica, poderosa, milionária, capaz de convencer a todos que para qualquer coisa há uma pílula milagrosa, que curará sem grandes dificuldades e sem exigir grandes sacrifícios. Fácil, cômodo, banal.
A Medicina passou então a cuidar da doença, e não do doente. O médico, que antes representava papel de profundo respeito e confiança, passou a ser visto como frio, calculista, e até cruel... Incapaz de sequer ouvir o paciente, com tempo reduzido ao insuficiente para sua consulta, irritado com o excesso de trabalho, e má remuneração, destruiu voluntaria ou involuntariamente a sagrada relação médico-paciente. E a Arte, a Filosofia, a Religião? A grande maioria dos médicos sequer tem a coragem de abordar tais assuntos, e se vê constrangida ao falar de fé em seus consultórios, como se fosse assunto proibido pelo decreto Placebo.
O que ocorreu?
Esqueceu-se que a Medicina tem aproximadamente 250.000 anos, o mesmo tempo que o Homo sapiens surgiu na Terra. E que a ciência praticada hoje no Ocidente, tem apenas 300 anos...
A Medicina sempre foi praticada, seja por pajés, sacerdotes, feiticeiros, filósofos, curiosos que se dedicavam ao aprendizado... e apesar disso, em toda sua história, ela usufruiu de grande prestígio e respeito. Um mixto de Temor e Admiração acompanhava aquele que se aventurasse no aprendizado desta Arte.
Quais interesses são tão fortes assim, capazes de inverter uma história tão bela e magnífica como a da Medicina? Apenas um. Dinheiro. Ainda as 30 moedas de prata que compraram o solo de sangue...
Tudo parece perdido? Não. É apenas a força portentosa do Tao em ação!
Novamente o Tao se mostra, e brotam por todos os lados novas correntes de pensamento, que começam a invadir os meios universitários, despertando a curiosidade e o interesse de renomados professores... Acupuntura e Homeopatia são apenas os mais importantes e magníficos exemplos de técnicas que anteriormente eram desprezadas, e que agora adquiriram respeito e reconhecimento das entidades médicas e da sociedade. A fitoterapia, embora sempre perseguida pela indústria farmacêutica, insiste em permanecer na cultura de todos os povos, e a suscitar curiosidade e pesquisas da própria indústria... Ainda bem!
Ainda que diferentes, a Medicina Ocidental e a Medicina Oriental mostraram na teoria do Tao, serem pólos de um mesmo caminho. Parecem incompátiveis? Isso é mera ilusão. Próton e elétron, embora com cargas elétricas diferentes, juntas formam um átomo. Um sem o outro são apenas partículas dispersas no Universo do microcosmo.

Jociane Neves Negrão
Médica – Especializanda em Medicina Tradicional Chinesa (Center AO)
Aluna do 2º ano de Teologia Umbandista (FTU)

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