Enquanto os clientes com convênios médicos são rapidamente atendidos, os pacientes do SUS enfrentam filas
Anúncio de que hospital quadruplicará serviços prestados a convênios preocupa pessoas que não têm plano de saúde
LAURA CAPRIGLIONE
DE SÃO PAULO
LUCCA ROSSI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Você chega por uma alameda arborizada, entra em um prédio limpo, bem iluminado, com funcionárias gentis em uniformes impecáveis.
Sentado em confortável cadeira anatômica, você olha para a figueira secular em um jardim interno decorado em estilo oriental. Com atraso de 25 minutos, o médico, um professor da prestigiosa Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, chama-o para a consulta.
Não, não se trata do hospital Sírio-Libanês, do Albert Einstein ou congênere. O hospital top de linha descrito é o símbolo da medicina pública paulista, o Hospital das Clínicas, na zona oeste de SP.
Esse pedaço do HC, na rua Doutor Ovidio Pires de Campos, atende a doentes com planos de saúde. Na fachada do prédio, lê-se: “Central de Convênios”. Ali não é lugar para gratuidades.
Na porta do Instituto de Ortopedia e Traumatologia, que fica na mesma rua da Central de Convênios, acontece o seguinte diálogo:
“Eu gostaria de passar por uma consulta. Dor na coluna.” A moça na portaria indaga: “Onde a senhora mora?”.
“Pinheiros.”
“Tem encaminhamento? Passou pela UBS [posto de saúde] antes? Não? Então não tem jeito. Sem encaminhamento, não tem como ser atendido.”
“Mas não tem atendimento para plano de saúde?”
“A senhora tem plano? Por que não disse antes? É só subir ao primeiro andar.”
Dez minutos depois, a paciente sai do prédio com a consulta marcada para o dia 1º de junho, às 14h30, em um ambulatório que serve exclusivamente aos convênios.
No setor destinado ao SUS (térreo do mesmo prédio), lotado na quinta-feira, a paciente I., desempregada, 60 anos, portadora de múltiplos tumores ósseos, é uma entre mais de cem pessoas a esperar sua consulta. I. conta que já teve de aguardar um ano por uma ressonância magnética. Resultado do exame nas mãos, esperou mais seis meses pela consulta.
No setor de convênios, tudo voa. A paciente pergunta ao atendente quanto tempo teria de esperar entre uma indicação de cirurgia e a operação propriamente dita. Resposta: “No máximo, 15 dias.”
Os pacientes SUS estão apreensivos com o anúncio feito pelo superintendente do HC, Marcos Fumio Koyama, de que quadruplicará nos próximos quatro anos o número de serviços prestados a convênios. Hoje, 3% dos atendimentos são vendidos aos planos. A previsão é atingir 12%.
Para a enfermeira aposentada M., 60, com diverticulite (inflamação na alça do intestino), “os planos de saúde já dispõem de mordomias demais no HC. Não é justo pacientes que só contam com o SUS terem de esperar enquanto doentes com convênios, com todas as opções que têm, passam na frente”.
A Folha testou, na última terça-feira, os prazos para marcação de consultas no setor de convênios.
Dor no joelho? Consulta dali a três dias. Ansiedade? Consulta com psiquiatra geral seis dias depois. Uma tomografia de tórax? O Instituto de Radiologia providencia em três dias.
Não, não se trata do hospital Sírio-Libanês, do Albert Einstein ou congênere. O hospital top de linha descrito é o símbolo da medicina pública paulista, o Hospital das Clínicas, na zona oeste de SP.
Esse pedaço do HC, na rua Doutor Ovidio Pires de Campos, atende a doentes com planos de saúde. Na fachada do prédio, lê-se: “Central de Convênios”. Ali não é lugar para gratuidades.
Na porta do Instituto de Ortopedia e Traumatologia, que fica na mesma rua da Central de Convênios, acontece o seguinte diálogo:
“Eu gostaria de passar por uma consulta. Dor na coluna.” A moça na portaria indaga: “Onde a senhora mora?”.
“Pinheiros.”
“Tem encaminhamento? Passou pela UBS [posto de saúde] antes? Não? Então não tem jeito. Sem encaminhamento, não tem como ser atendido.”
“Mas não tem atendimento para plano de saúde?”
“A senhora tem plano? Por que não disse antes? É só subir ao primeiro andar.”
Dez minutos depois, a paciente sai do prédio com a consulta marcada para o dia 1º de junho, às 14h30, em um ambulatório que serve exclusivamente aos convênios.
No setor destinado ao SUS (térreo do mesmo prédio), lotado na quinta-feira, a paciente I., desempregada, 60 anos, portadora de múltiplos tumores ósseos, é uma entre mais de cem pessoas a esperar sua consulta. I. conta que já teve de aguardar um ano por uma ressonância magnética. Resultado do exame nas mãos, esperou mais seis meses pela consulta.
No setor de convênios, tudo voa. A paciente pergunta ao atendente quanto tempo teria de esperar entre uma indicação de cirurgia e a operação propriamente dita. Resposta: “No máximo, 15 dias.”
Os pacientes SUS estão apreensivos com o anúncio feito pelo superintendente do HC, Marcos Fumio Koyama, de que quadruplicará nos próximos quatro anos o número de serviços prestados a convênios. Hoje, 3% dos atendimentos são vendidos aos planos. A previsão é atingir 12%.
Para a enfermeira aposentada M., 60, com diverticulite (inflamação na alça do intestino), “os planos de saúde já dispõem de mordomias demais no HC. Não é justo pacientes que só contam com o SUS terem de esperar enquanto doentes com convênios, com todas as opções que têm, passam na frente”.
A Folha testou, na última terça-feira, os prazos para marcação de consultas no setor de convênios.
Dor no joelho? Consulta dali a três dias. Ansiedade? Consulta com psiquiatra geral seis dias depois. Uma tomografia de tórax? O Instituto de Radiologia providencia em três dias.
Somos vítimas da competência, diz hospital
DE SÃO PAULO
Em nota oficial, o Hospital das Clínicas disse ser “”vítima” de sua própria competência”. “Por ser considerado referência em assistência hospitalar e por ter, em seu quadro médicos renomados, entre os melhores do país, o HC recebe um grande volume de pacientes, vindos (…) até de outros Estados”.
“O tempo médio de espera depende do tipo de exame e consulta, e do número de pessoas que necessitam de exames e consultas, independentemente de ser via SUS ou plano de saúde suplementar”, afirma o texto.
O hospital não admite que haja diferenças nos prazos.
Quanto às diferenças de instalações, a nota as atribui à necessidade de fazer um “controle melhor pelos centros financeiros”. Apesar disso, diz o HC, o atendimento de todos os pacientes “é igual, sem diferenciação de procedimentos, equipamentos, corpo clínico e hotelaria”.
“É importante ressaltar que 11% de todos os pacientes atendidos gratuitamente no Hospital das Clínicas possuem algum tipo de convênio ou plano de saúde, onerando o SUS e retirando recursos da assistência pública”, diz.
“O tempo médio de espera depende do tipo de exame e consulta, e do número de pessoas que necessitam de exames e consultas, independentemente de ser via SUS ou plano de saúde suplementar”, afirma o texto.
O hospital não admite que haja diferenças nos prazos.
Quanto às diferenças de instalações, a nota as atribui à necessidade de fazer um “controle melhor pelos centros financeiros”. Apesar disso, diz o HC, o atendimento de todos os pacientes “é igual, sem diferenciação de procedimentos, equipamentos, corpo clínico e hotelaria”.
“É importante ressaltar que 11% de todos os pacientes atendidos gratuitamente no Hospital das Clínicas possuem algum tipo de convênio ou plano de saúde, onerando o SUS e retirando recursos da assistência pública”, diz.
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