quarta-feira, 9 de março de 2011

O que é feminização da pobreza?

Dois pesquisadores brasileiros defendem que o conceito deve levar em conta variação ao longo do tempo e comparação entre gêneros




da PrimaPagina



É razoavelmente comum a afirmação de que as mulheres são a maioria entre os pobres ou que sua renda não acompanha a dos homens. Essa percepção deu origem a um termo que surgiu na década de 70, ganhou força na de 90 e hoje é objeto de controvérsias: feminização da pobreza. Como engloba dois problemas graves — pobreza e desigualdade de gênero — e, portanto, precisa ser alvo de políticas públicas, é fundamental definir mais claramente o conceito, argumentam dois pesquisadores do Centro Internacional de Pobreza, uma instituição de pesquisa do PNUD em parceria com o IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).

O assunto “merece atenção especial dos formuladores de políticas na determinação da alocação de recursos para medidas pró-eqüidade de gênero ou antipobreza. Se a pobreza não está sendo ‘feminizada’, os recursos podem ser direcionados para outros tipos de política”, afirmam Marcelo Medeiros e Joana Costa no artigo What do we mean by “Feminization of Poverty”?.

Eles defendem que o conceito deve significar uma “mudança nos níveis de pobreza com uma tendência desfavorável às mulheres ou aos domicílios chefiados por mulheres”. O termo pobreza é tomado como “falta de recursos, capacidades ou liberdades”.

Como se trata de mudança, “feminização” tem de implicar processo, argumentam os autores — mais especificamente, um processo que faça com que as carências implícitas no conceito de pobreza se tornem mais comuns ou intensas entre as mulheres ou nos lares por elas chefiados. “Como implica mudança, a feminização da pobreza não deve ser confundida com a prevalência de níveis maiores de pobreza entre as mulheres ou domicílios chefiados por mulheres. Feminização é um processo, enquanto ‘maior nível de pobreza’ é um estado”, afirma o artigo.

Além disso, a palavra remete à comparação entre os gêneros. Assim, haveria feminização da pobreza não só numa situação de perda de renda das mulheres, mas também num quadro em que a pobreza cai mais entre os homens do que entre elas.

Para monitorar o fenômeno, os pesquisadores sugerem a análise da variação de dois indicadores ao longo do tempo: proporção de mulheres pobres e de domicílios pobres chefiados por mulheres. O primeiro é importante por abranger um universo amplo: também leva em conta crianças e adolescentes do sexo feminino ou a esposa do chefe de domicílio. O segundo, porém, pode refletir mais diretamente as diferenças entre os gêneros.

Nos dois casos, os cálculos se baseiam no universo de mulheres — ou seja: do total de mulheres, qual é a proporção de pobres (ou do total de domicílios chefiados por mulheres, qual a proporção dos pobres). Os autores consideram inadequado tomar como base o universo de pobres — ou seja: dos pobres, quantos são mulheres (ou, dos domicílios pobres, quantos são chefiados por mulheres). Nesse enfoque, argumenta o texto, “as medidas de feminização da pobreza podem ser afetadas por mudanças na composição demográfica da população.” Em entrevista à PrimaPagina, Joana Costa cita o exemplo da alteração do perfil da chefia dos domicílios. Um enfoque que se restrinja ao universo dos pobres indicaria que, entre os lares pobres, aumentou a proporção dos que são chefiados por mulheres — haveria, portanto, uma feminização da pobreza. “Mas esse fenômeno [aumento de domicílios chefiados por mulheres] ocorre em todas as camadas da população, não apenas entre os pobres. É algo demográfico”, argumenta.


http://www.pnud.org.br/pobreza_desigualdade/reportagens/index.php?id01=3020&lay=pde



Cuidado com os filhos e a casa força segunda jornada de trabalho e diminui renda das mulheres

Publicado em março 9, 2011 por HC
A má distribuição de tarefas entre homens e mulheres em casa e no cuidado com os filhos é apontada como fator limitante para inserção das mulheres no mercado de trabalho, em carreiras com melhor remuneração.
“As mulheres não entram em condições de igualdade com os homens no mercado de trabalho por causa da dupla jornada que exercem e não são remuneradas por conta de cuidados com os filhos, com a casa e, com as pessoas doentes e, às vezes, até com com o trabalho comunitário”, aponta Eliana Graça, assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) e voluntária do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea).
“A responsabilidade dupla das mulheres acaba fazendo com que ela se insira de forma mais precária no mercado de trabalho; contribuindo decisivamente para que as famílias chefiadas por elas estejam mais presentes na pobreza do que as famílias chefiadas por homens”, complementa a economista Luana Simões Pinheiro, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Luana pondera, no entanto, que a inserção precária no mercado de trabalho não se deve apenas ao domínio masculino e a ações descriminatórias do mercado. “Essa questão se reproduz pelos homens e pelas mulheres. É uma questão de dois lados. Não tem só vítimas, mocinhos e bandidos nessa história. Todo mundo reproduz no cotidiano”, enfatiza ao lembrar que “as meninas nascem ganhando um kit cozinha, com panelinhas, e os meninos ganhando um carrão de brinquedo, que incentiva a velocidade a não ter medo, a ter coragem”.
O sociólogo e professor da Universidade de São Paulo (USP) Gustavo Venturi destaca que todo fenômeno de dominação e opressão só ocorre porque aqueles que têm um papel subalterno assumem valores do grupo dominante. “Muitas mulheres contribuem para a reprodução dessa cultura machista, ainda que sofram fortemente suas consequências”, avalia.
Venturi coordenou a pesquisa Mulheres Brasileiras e Gênero nos Espaços Público e Privado, feita para a Fundação Perseu Abramo (ligada ao PT) para o Serviço Social do Comércio (Sesc), na qual 30% dos homens se declararam machistas (4% “muito machistas”).
A pesquisa recentemente divulgada pela Secretaria de Políticas para as Mulheres (aplicada em agosto de 2010) foi comparada a outro estudo semelhante de 2001. Para Venturi, no intervalo de nove anos, foram poucas as mudanças no “consenso” de que são as mulheres que devem cuidar dos filhos desde a primeira infância. De lá para cá, cresceu de 27,3% para 35,2% o número de famílias chefiadas por mulheres segundo dados do Instituto de Estudos do Trabalho e da Sociedade (IETS).
Eliana Graça, do Cfemea e do Inesc, aponta que as políticas públicas que foram criadas pelo governo federal nesse período, como o Programa Bolsa Família, mantém o preconceito de que o cuidado com os filhos é responsabilidade exclusiva das mães. Noventa e três por cento dos cartões do programa são em nome das mulheres. “Assim, o programa cristaliza o papel da mulher que nós estamos acostumados: o papel da mãe cuidadora”.
Reportagem de Gilberto Costa, da Agência Brasil, publicada pelo EcoDebate, 09/03/2011

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