segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

A Paridade de gênero e os Consensos de Quito e Brasília

José Eustáquio Diniz Alves
Publicado em dezembro 6, 2010 by HC

O povo brasileiro deu um passo à frente na luta por uma maior igualdade de gênero ao sufragar com 2/3 do total de votos as candidatas Dilma Rousseff (47,7 milhões de votos) e Marina Silva (19,6 milhões de votos) no primeiro turno e ao eleger a primeira mulher Presidenta do Brasil, no segundo turno (como 55,8 milhões de votos).

Não deixa de ser surpreendente que, mesmo sendo um país com tão poucas mulheres na política, o Brasil terá, a partir de 2011, uma mulher no cargo máximo do Executivo, se adiantando em relação aos Estados Unidos (que fez sua independência em 1776), à França (que fez uma revolução em 1789) e a outros países democráticos e com melhores indicadores de gênero.
Contudo, este grande passo à frente tem que ser acompanhado de outros passos rumo à maior equidade de gênero nas diversas instâncias da democracia. Uma medida imprescindível é a adoção do princípio de paridade de gênero nos espaços de poder. Medidas concretas que avancem neste sentido só dependem da presidenta e dos/as governadores/as eleitos/as.
Na Europa e no resto do mundo existe a campanha 50/50 (fifty/fifty) pela democracia. Já na América Latina foi aprovado, em 2007, o chamado “Consenso de Quito” que foi um acordo que o Brasil assinou na 10ª Conferência Regional sobre a Mulher da América Latina e do Caribe, ocorrida no Equador. Nesta Conferência regional foi reforçada a idéia de que a paridade de gênero é essencial para o desenvolvimento e a democracia:
Reconociendo que la paridad es uno de los propulsores determinantes de la democracia, cuyo fin es alcanzar la igualdad en el ejercicio del poder, en la toma de decisiones, en los mecanismos de participación y representación social y política, y en las relaciones familiares al interior de los diversos tipos de familias, las relaciones sociales, económicas, políticas y culturales, y que constituye una meta para erradicar la exclusión estructural de las mujeres” (CEPAL, 2007, pág. 3).
A partir deste reconhecimento, o Consenso de Quito recomendou aos países da região:
Adoptar todas las medidas de acción positiva y todos los mecanismos necesarios, incluidas las reformas legislativas necesarias y las asignaciones presupuestarias, para garantizar la plena participación de las mujeres en cargos públicos y de representación política con el fin de alcanzar la paridad en la institucionalidad estatal (poderes ejecutivo, legislativo, judicial y regímenes especiales y autónomos) y en los ámbitos nacional y local, como objetivo de las democracias latinoamericanas y caribeñas” (CEPAL, 2007, pág. 4).
Estas posições foram reafirmadas e ampliadas na 11ª Conferência Regional sobre a Mulher da América Latina e do Caribe, realizada em Brasília, de 13 a 16 de julho de 2010. O chamado Consenso de Brasília recomendou aos países da região:
Promover a criação de mecanismos e apoiar os que já existem para assegurar a participação político-partidária das mulheres que, além da paridade nos registros das candidaturas, assegurem a paridade nos resultados, garantam o acesso igualitário ao financiamento de campanhas e à propaganda eleitoral, assim como sua inserção nos espaços de decisão nas estruturas dos partidos políticos. Da mesma forma, criar mecanismos para sancionar o descumprimento das leis neste sentido” (Cepal, 2010, p. 8)
Em seu discurso de vitória, na noite do dia 31 de outubro, Dilma Rousseff disse que vai “honrar as mulheres brasileiras” e vai lutar pela “igualdade de oportundidades”. As palavras da nova Presidenta do Brasil são uma esperança de que a equidade de gênero se torne uma realidade no país. Porém, para que se passe da intenção à ação, Dilma Rousseff, o PT e os demais particos da coligação “Para o Brasil seguir mudando”, precisam incentivar duas medidas imediatas:
  1. promover o estabelecimento de “gabinetes paritários” (metade homem e metade mulher) nos espaços de poder, ao nível do ministério federal, das secretarias estaduais e das empresas públicas;
  2. garantir paridade de gênero na disputa aos cargos de vereadores nas eleições municipais de 2012, quando o Brasil vai comemorar 80 anos do direito de voto feminino.
A presidenta Dilma Rousseff está prometendo nomear 30% de mulheres para o ministério que vai tomar posse em janeiro de 2011. Não é a paridade, mas é um passo neste sentido. Ela já indicou Miriam Belchior para o importante Ministério do Planejamento. É preciso que a sociedade brasileira pressione, tanto a nível federal como estadual, para que haja mais equidade de gênero nos espaços de poder.
O Brasil já assinou os Consensos de Quito e Brasília. Falta colocá-los em prática. Aliás, é bom lembrar o que já disse o grande revolucionário e idealista Charles Fourrier, há mais de 200 anos: “O grau de emancipação das mulheres em uma sociedade é o termômetro através do qual se mede à emancipação geral”.
Referências:
European Women’s Lobby 50/50 Campaign for Democracy
CEPAL, X Conferencia Regional sobre la Mujer de América Latina y el Caribe, Quito, 6-9 agosto de 2007
Consenso de Quito
CEPAL, XI Conferencia Regional sobre la Mujer de América Latina y el Caribe, Brasilia del 13 al 16 de julio de 2010.
Consenso de Brasilia
José Eustáquio Diniz Alves, articulista do EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE. As opiniões deste artigo são do autor e não refletem necessariamente aquelas da instituição. E-mail: jed_alves{at}yahoo.com.br
EcoDebate, 06/12/2010

http://www.ecodebate.com.br/2010/12/06/a-paridade-de-genero-e-os-consensos-de-quito-e-brasilia-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/

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